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terça-feira, 25 de agosto de 2015

A cidade, a vida, um CIRCO URBANO...



Estreou no dia 22 de agosto, com direção de Rafael Camargo, o espetáculo CIRCO URBANO que retrata o cotidiano de uma cidade. São seis artistas que revezam no palco suas habilidades circenses numa poesia que encanta, pois transforma a dureza do asfalto, das calçadas e escritórios em movimento. e magia.





A rotina e o corre-corre das pessoas, acordar, trabalhar, correr, dormir...os encontros marcados, os inusitados, as decepções e pequenas surpresas no decorrer das horas...os sonhos... elementos que estão implícitos na dança, nos jogos de cena, nos movimentos precisos, nos olhares dos artistas...



A combinação da trilha sonora, iluminação e coreografia é um dos pontos fortes do espetáculo. Figurino e maquiagem oferecem a caracterização circo/cidade, uma urbanidade poética sem exageros, mas com um toque de classe. O cenário/palco é um todo pulsante...onde os artistas exploram todos os cantos possíveis, assim como toda cidade tem muitos becos inexplorados!



Para quem vive o caos das grandes cidades, com certeza vai se identificar com a temática e faz todo sentido. Digno!

Elenco:
Carmela Ferraz
Luthy Milano
John Salgueiro
Lauro Monteiro
Robinson Tocera
Gustavo Soslaio

Ficha Técnica:
Direção: Rafael Camargo
Coreografia: Carmela Ferraz
Assistência de Direção e Iluminação: Rodrigo Ziolkowski
Criação Musical e Sonoplastia: Lilian Nakahodo
Cenário: Alfredo Gomes Filho
Figurino: Cristine Conde
Maquiagem: Jonatha Ribas

Assessoria de Imprensa: Fernando de Proença
Fotografia: Elenize Dezgeniski
Vídeo: Alan Raffo
Direção de Produção: Diego Marchioro
Produção: Rosa Aragón

SERVIÇO:

Vila Hauer Cultural
Rua Bom Jesus de Iguape, 2121
(41) 9119-3390 9876-3596

29 de agosto a 20 de Setembro
Sábados e domingos às 17h

Ingressos: R$ 20,00 inteira e R$ 10,00 meia






quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Quem tem medo de Simone Beauvoir? Marcia Tiburi


Se hoje em dia fizéssemos uma resenha de O Segundo Sexo, livro publicado por Simone de Beauvoir em 1949, portanto, há mais de sessenta anos, ainda estaríamos sendo atuais.
Há quem goste de dizer que O Segundo Sexo é um livro ultrapassado.
Podemos nos perguntar, ultrapassado para quem?
Não certamente para o Brasil, infelizmente, atrasado em tudo o que mais importa relativamente a gênero: questões como legalização do aborto, equiparação salarial e, em um nível cotidiano, a desigualdade doméstica que faz pesar em escala privada as naturalizações gritantes na escala pública. 

O Brasil é atrasado e está afundando cada vez mais no obscurantismo no que tange ao tema gênero, sobretudo quando surgem fatos como a recente retirada da questão das metas da educação nacional. Raça e classe social também são assuntos que precisam ser mantidos longe para a manutenção da miséria da educação brasileira que contribui, por sua própria inanição, para uma cultura cada vez mais empobrecida no que se refere à reflexão que, na base de tudo, poderia orientar ações em outra direção. Ora, fazer feminismo hoje implica perceber os arranjos da dominação de gênero e todas as demais formas de dominação.
Neste cenário, o conteúdo de O Segundo Sexo assusta. Salvo exceções, as feministas comprometidas com a teoria para o qual o livro é um clássico, ninguém leu as duas mais de quinhentas páginas. Dizer que é um clássico também pode ser pouco profícuo. Seria melhor que as pessoas tratassem O Segundo Sexo como auto-ajuda ou até como bula de remédio, perdessem o medo de Simone de Beauvoir, e o lessem de uma vez em favor da cultura. 
Ele deveria ser lido não por feministas apenas, mas por mulheres, homens e todos as pessoas que, de um modo ou de outro, estão marcados pela questão de gênero, porque se trata de um livro básico, que nos ensina a pensar sobre as desigualdades e privilégios de gênero, aqueles que experimentamos como os mais naturais sem perceber como nos marcam. Em palavras bem simples: quem nunca se sentiu incomodada por ser “marcada” como mulher antes de ser uma pessoa como qualquer outra?

O livro de Simone de Beauvoir foi fundamental para colocar os pingos nos is dessa questão. Se o feminismo sempre foi a teoria que buscou legitimar a reivindicação de direitos para as mulheres, com Simone de Beauvoir ele se tornou a consciência crítica e, ao mesmo tempo, transformadora da desigualdade de gênero. 

A frase “ninguém nasce mulher, mas se torna” desmascara a invenção histórica que fez padecer “homens” e “mulheres” sob estereótipos em nada relacionados à sua auto-compreensão subjetiva. Com essa ideia começa o que muitos chamam de “segunda onda” do feminismo caracterizada justamente pela desmontagem da questão de gênero.
Quem defende ou elogia hoje a teoria queer, que realmente é uma teoria riquíssima, não se dá conta de que no Brasil não chegamos nem à básica teoria feminista de Simone de Beauvoir que questiona a condição feminina que permanece naturalizada entre nós nos estratos mais fundamentais da cultura. A naturalização é o que experimentamos no dia a dia quando vivemos dentro do binarismo “homem-mulher” considerando todas as formas que não se encaixem nesse padrão heterossexual como inadequadas, senão como um erro da natureza.
No que concerne ao gênero isso implica divisão do trabalho, dentro e fora de casa, e um sistema de preconceitos que converge com os privilégios masculinos.

Simone de Beauvoir aposta na crítica do patriarcado enquanto analisa sua história e mais ainda, ela aposta na autocrítica da condição feminina e se afasta, por meio dela, da vitimização com que as mulheres, camuflando uma fragilidade totalmente fictícia, se protegeram dos homens. A vitimização é muitas vezes a estratégia de certos feminismos que não percebem sua armadilha enquanto, ao mesmo tempo, reproduzem o patriarcado por meio de sua sustentação. Com isso, Beauvoir não quer dizer que não existam vítimas, mas que a vítima feminina é forjada dentro do patriarcado. 




E que as posturas que não a superam, reproduzem aquilo que gostariam de negar. Assim, a diferença entre uma vítima concreta e aquilo que podemos chamar de vítima ideológica, o sujeito da proscrição, precisa ser desfeita, pois essa estrutura acaba por se reproduzir simbolicamente fazendo repetir-se o próprio sistema em que é gerada. 

Para citar outros feministas, aqueles que publicaram a “Dialética do Esclarecimento” dois anos antes de O Segundo Sexo, o proscrito desperta o desejo de proscrever. Em palavras mais simples: uma mulher frágil desperta o desejo de fragilizar. Um vítima em potencial é um convite para a agressão. Por isso, cabe perguntar com Simone de Beauvoir, como a mulher faz o aprendizado da condição de frágil e de vítima? Se uma resposta já não pode se sustentar do ponto de vista da “natureza”, que cultura é essa que a inventa?
O que se ganha é a manutenção do poder na mão de homens, mas não só, na mão de todos aqueles que pregam a moral-violência machista contra a qual devemos sustentar uma ético-política feminista que inclua todos as pessoas em um cenário de direitos e de respeito à singularidade para além de marcações.